Em época de terceira fase no ensino superior (oi? que fase? isso existe? - eu sei, ninguém quer saber da terceira fase) não me posso esquecer dos trifásicos. Eu fui um deles.
Na segunda fase entrei na universidade que queria, mas num curso de engenharia, que nem sabia ao certo para que servia. O meu pai ficou empolgadíssimo porque a localização da universidade era super conveniente. Dormi com a notícia da colocação e acordei com a sensação que estava tudo errado. Falei com os meus pais e decidi nem sequer me matricular, nem sequer para garantir a vaga, e concorrer na terceira fase. Foi arriscado. Concorri à última fase e fui ter ao curso e à cidade onde tudo fazia mais sentido. E fez. E fico muito feliz por ter tido força para ouvir o meu instinto, para explicar aos meus pais que "algo não estava bem".
Quem chega na terceira fase chega em desvantagem. As aulas já começaram, as praxes já começaram, já só sobram as casas más, os grupos já estão formados, as dinâmicas já estão estabelecidas. Cheguei e tive um exame na semana seguinte, falhei redondamente, como seria de esperar.
Hoje, independentemente da fase, olho para o ensino superior como algo muito ingrato sobretudo no que toca ao alojamento. Como é que há a coragem de pedir 300, 400, 500€ por um quarto? Não imagino a sensação de cumprir um objetivo de vida, ex.: entrar no curso de sonho, na cidade que queriam, fruto de anos de esforço e pedirmos aos pais que arquem com 500€ de casa, propinas, mais contas, mais passe, mais alimentação, traje, livros, fotocópias, viagens a casa, mais um café ou jantar de curso. Só falando no ensino público. É um assombro!
Eu tive essas questões em consideração. O privado ficou logo fora de questão, embora o meu irmão tivesse seguido para o privado, dez anos antes. Talvez por estar a par dos custos seria incapaz de pedir isso aos meus pais. A cidade também foi determinante, não me candidatei aos grandes centros, Porto por causa do preço do alojamento, nem Lisboa porque era uma miúda que toda a vida tinha vivido num aldeia, que não gostava da cidade em si (sorry!), achei que não tinha nada a ver com quem cresceu a brincar na rua e a voltar de noite para casa, não me sentia estava minimamente preparada para ir para lá. Cheguei a concorrer para o Algarve, sendo eu do distrito do Porto, mas recusei-me a concorrer para a capital.
Tenho o máximo de respeito pelos pais que suportam este nível de encargos, pelos estudantes que sentem este peso nas suas costas, pelos trabalhadores-estudantes que trabalham para conseguirem estudar e que contam moedas.
Fui estudar para o interior, pagava 125€ a, no máximo, 150€ de quarto, (quartos enormes com casa de banho privada) pagava as propinas mais baixas do país e tive direito a bolsa de estudo. Nada disto foi ao acaso. Tudo isto tinha sido calculado, apesar dos meus pais nunca terem dito absolutamente nada em relação a isso, mas eu estava hiperconsciente de tudo. Acho que desde cedo me tornei super racional a nível financeiro, com fases de menor clarividência, claro, mas ainda assim consciente.
Uma enorme ajuda foi uma conta poupança que os meus pais me fizeram, por incentivo do meu irmão, especificamente para o futuro na universidade. Acabou por ser muito importante, o meu pai ficou desempregado nessa altura, a minha mãe também não trabalhava e, apesar disso, aquela salvaguarda não foi precisa, uma vez que os custos eram "comportáveis", mas era um conforto enorme saber que "estava tudo bem".
Agora, claro que há cursos e universidades específicas que só se conseguem nos grandes centros e é uma pena que para cumprir um sonho, os pais e os estudantes sejam completamente extorquidos por rendas absurdas. Eu com 300€, há 10 anos, pagava quarto, despesas, viagens a casa, comida, tudo o que precisava. Agora 300€, em muitos sítios, não se paga nem o quarto.
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